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Ryan de Oliveira

Origem e Enraizamento do Racismo

Atualmente, vários temas vêm sendo discutidos dentro da sociedade, dando olhares para debates sobre desigualdade que antes eram ignorados ou até mesmo desconhecidos. Um desses temas é o racismo, que vem sendo discutido diariamente. Hoje essa pauta tem bastante visibilidade, de modo que entender o que é e como impedir a prática desse tipo de preconceito são urgentes. Entretanto, entender como o racismo se comporta hoje em dia não é o suficiente. Para compreender o racismo como um todo, devemos entender suas origens e por que ele veio a se enraizar na sociedade atual, inclusive nas manifestações artísticas, como a literatura.

Quando tratamos de algo como o racismo, discutimos muito mais do que apenas uma injustiça que tem como principal alvo a população negra. Trata-se de questões enraizadas desde a época da Idade Média, em que absurdos eram ditos para justificar injustiças perante outras pessoas, em outro continente, em seu próprio lar, sendo oprimidos sem chance de defesa ou explicação.

Como já percebemos, esse contexto é o que conhecemos acerca da exploração europeia sobre os povos africanos. O colonialismo, movido por interesses capitalistas, foi o principal responsável pela opressão de povos africanos durante esse período. Por mais que a aquisição de novos metais, interesse em novos produtos por parte da burguesia e a ideia da Igreja de espalhar a fé cristã pelas novas terras fossem motivos para as expedições, o resultado foi que a atividade econômica mais valorizada (principalmente pelos portugueses) foi o tráfico de escravos.


O racismo nos primórdios do Brasil


Com relação ao Brasil, ou a antiga e conhecida Terra de Santa Cruz, temos aqui a chegada dos portugueses e o começo da exploração extrativista como fonte econômica principal. Com o passar dos anos, sendo uma região onde a compra de escravos era comum, o Brasil começa a tomar uma identidade, mas não uma identidade de nativos ou mulatos, mas sim uma identidade portuguesa. Percebemos isso em documentos escritos muitas vezes por integrantes da Companhia de Jesus, que descreviam o Brasil em versões que impediam que uma cultura indígena fosse agregada completamente àquele Brasil que estava se formando.

A independência também não procurou consertar isso, já que envolveu a elite brasileira, com seus valores portugueses, além de D. Pedro I, filho de D. João VI, ter sido o carro chefe dessa iniciativa. Ora, essa identidade trazia, além de valores portugueses, toda uma cultura de ideias racistas, que influenciou, além de valores portugueses, toda uma cultura de ideias racistas, que influenciou o racismo estruturado que temos hoje no Brasil.

O racismo na Literatura


Podemos entender também como o racismo se mantém enraizado analisando a nossa própria literatura. Para isso temos as obras de Machado de Assis, um dos maiores escritores brasileiros. Em suas obras, temos grandes ironias e críticas envolvendo a sociedade da época e o racismo que a permeava. Podemos notar essa presença em Memórias Póstumas de Brás Cubas, que, de forma realista, descrevia as injustiças da época.

Um dos capítulos mais famosos de Memórias Póstumas de Brás Cubas traz bem esse aspecto. O capítulo LXVIII, “O Vergalho”, conta o episódio em que Brás Cubas avista um ajuntamento de pessoas em torno de um castigo de um negro. Após se aproximar, Brás Cubas se surpreende, ao perceber que o açoitador era Prudêncio, seu ex-escravo, que agora açoitava outro preto de sua propriedade.

Após reconhecer o homem que aplicava os castigos, Brás Cubas intervém sobre a vítima e pede a Prudêncio que o perdoe; e assim foi feito por Prudêncio. Em seguida Brás Cubas se encontra refletindo sobre as atitudes do conhecido e lembra-se de como, quando criança, tratava Prudêncio. Fazia atos como subir em cima de seu escravo e montava no negro como se fosse um cavalo: “fustigava-o”.

Nesse capítulo, vemos uma ideia em que, mesmo livre, Prudêncio tomara para si a ideia de maltratar outro de mesma cor, assim como foi maltratado por Brás Cubas. Uma possível reflexão sobre esse trecho de Memórias Póstumas é entender que um indivíduo, quando muito jovem, é vítima de algum tipo de opressão pode reproduzir essa mesma opressão em outras pessoas. O enraizamento do racismo no Brasil é um exemplo em larga escala disso, em que uma série de fatores, já apresentados anteriormente, foram responsáveis por manter a discriminação racial no país até hoje.

Outro ponto importante, saindo agora da obra em si e olhando diretamente para o autor: Machado de Assis era negro e por muito tempo seus leitores e críticos pouco enfatizam esse aspecto. Até bem pouco tempo, livros didáticos apresentavam fotos de um Machado de Assis embranquecido.

É importante lembrar que a elite intelectual carioca do Século XIX era composta pela burguesia branca da época. Machado de Assis, embora negro, era considerado um integrante da elite intelectual carioca, o que automaticamente o tornava um escritor “branco”, tendo em vista que não se permitiria um reconhecimento de alguém negro. Um dos aspectos que podemos citar é o fato de que no atestado de óbito do escritor ele é identificado como branco. Essa ideia só seria posta em xeque quando Humberto de Campos, em 30 de setembro de 1933, escreveu um artigo para o “Diário de notícias”, no qual traçava um perfil de Machado de Assis: “[...] mulato de sangue, escuro de pele, e usava uma barba curta e de tonalidade confusa, que dava ares de antigo escravo brasileiro, filho do senhor e criado na casa de boa família.”

Em suas obras, também é possível observar um distanciamento do autor quanto a suas origens. Suas narrativas tinham como protagonistas brancos da elite e seus problemas existências. Quando um negro era introduzido na narrativa, ele exercia o “papel de preto” esperado pela elite da época. Sendo assim, Machado produziu sua ascensão omitindo as próprias origens, na maioria das vezes.


Para finalizar


Analisando esses dois fatores, podemos entender como ideias racistas influenciam e prejudicam a cultura dentro do país, mesmo em diferentes épocas. Logo, identificamos sim que o Brasil é um país racista, por mais que muitos ainda não acreditem nisso. Entender como o racismo vem sendo enraizado no país também é chave fundamental para entender como combatê-lo atualmente, pois com esse tipo de informação e conhecimento, é possível entender onde, por que e de que maneira as injustiças atuais acontecem e a melhor maneira de evitá-las.

As intervenções devem começar já nas escolas. Em aulas de história e de geografia se estuda muito pouco sobre as matrizes africanas e indígenas no país, dando quase total foco à narrativa do “descobrimento do Brasil pelos portugueses”. Dar valor a essa cultura, que sempre fez parte do nosso país, é a chave para combater o preconceito e a desigualdade que tanto sonda o Brasil atualmente.




cena do filme Memórias Póstumas de Brás Cubas


Ryan Oliveira Soares


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